Por Grazielle Seabra
Alienação parental e falsas acusações sob a ótica constitucional e legal
O enfrentamento à violência nas relações familiares é um dever do Estado e da sociedade. Historicamente e de forma justificada, a legislação brasileira concentrou esforços na proteção da mulher, reconhecendo desigualdades estruturais e altos índices de violência física e letal.
Entretanto, a maturidade de um sistema jurídico exige que ele seja capaz de reconhecer outras formas de violência, inclusive aquelas que não se manifestam fisicamente e que atingem homens em contextos familiares, especialmente por meio da alienação parental e de falsas acusações.
🔸Violência para além da agressão físicas
A Constituição Federal consagra a dignidade da pessoa humana como fundamento da República (art. 1º, III, CF) e assegura a todos:
a honra e a imagem (art. 5º, V e X, CF); o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa (art. 5º, LIV e LV, CF).
Assim, práticas que destroem reputações, rompem vínculos familiares ou instrumentalizam o sistema de justiça para fins de retaliação emocional configuram violência psicológica e institucional, ainda que não deixem marcas visíveis.
🔸Alienação parental como forma de violência psicológica
A Lei nº 12.318/2010 define a alienação parental como a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente, promovida por um dos genitores ou responsáveis, para que repudie o outro genitor ou dificulte a manutenção de vínculos afetivos (art. 2º).
A própria lei reconhece que tais atos: violam o direito fundamental da criança à convivência familiar saudável; configuram abuso moral; representam descumprimento dos deveres inerentes ao poder familiar.
Embora a lei seja neutra quanto ao gênero, a prática forense demonstra que, em separações litigiosas, pais frequentemente são afastados do convívio com os filhos com base em narrativas não comprovadas, produzindo danos profundos tanto ao genitor quanto à criança.
Trata-se de uma violência relacional que atinge simultaneamente: o direito do pai à convivência familiar (art. 226 e 227, CF);
o melhor interesse da criança, princípio central do Estatuto da Criança e do Adolescente.
🔸Falsas acusações e responsabilização penal
Outro ponto sensível é a utilização de falsas acusações como instrumento de conflito familiar ou patrimonial. O ordenamento jurídico brasileiro não legitima esse tipo de conduta.
O Código Penal prevê expressamente:
Denunciação caluniosa (art. 339, CP): dar causa à instauração de investigação ou processo contra alguém, imputando-lhe crime que sabe não ter sido praticado;
Comunicação falsa de crime (art. 340, CP): provocar a atuação da autoridade pública com informação sabidamente falsa;
Calúnia (art. 138, CP): imputar falsamente fato definido como crime.
Esses dispositivos não existem para silenciar vítimas reais, mas para proteger o sistema de justiça contra abusos, preservando sua credibilidade e eficácia.
🔸O impacto das falsas acusações no sistema de proteção
A utilização indevida de mecanismos legais de proteção gera efeitos graves:
destruição imediata da honra do acusado; imposição de medidas restritivas antes da apuração completa dos fatos; desgaste emocional e psicológico profundo; sobrecarga do sistema judicial.
Além disso, a banalização das denúncias prejudica diretamente as mulheres que realmente sofrem violência, pois enfraquece a confiança social e institucional nas políticas de proteção.
Reconhecer não é negar. Reconhecer que homens também podem ser vítimas de violência relacional não significa negar a violência contra a mulher, nem relativizar conquistas históricas. Significa reafirmar que o Direito deve proteger pessoas, e não narrativas.
A Constituição não autoriza a criação de vítimas invisíveis, nem legitima abusos praticados sob o manto da proteção legal.
🔸O papel do Direito: equilíbrio e verdade
O papel do sistema de justiça é:
proteger vítimas reais;
garantir o devido processo legal;
coibir abusos processuais;
responsabilizar condutas ilícitas, independentemente do gênero.
A justiça seletiva não fortalece direitos fundamentais, ela os fragiliza.
A alienação parental e as falsas acusações configuram formas graves de violência psicológica e institucional, com impacto direto sobre homens, crianças e sobre a própria credibilidade do sistema de proteção.
O verdadeiro compromisso com a justiça exige equilíbrio, responsabilidade e fidelidade à Constituição. Proteger vítimas reais e combater abusos não são objetivos opostos, são complementares.





















