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Entre a Lei e a Justiça: como evitar a repetição de casos de impunidade na violência contra a mulher

Caso de lutador de MMA condenado por estupro que foi solto, após 4 meses de prisão, gerou críticas e reacendeu debate sobre a aplicação de punição

Shewton Serra Por Shewton Serra
junho 16, 2025
in NOTÍCIA GERAL
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Entre a Lei e a Justiça: como evitar a repetição de casos de impunidade na violência contra a mulher

“O direito penal tem uma função de reprimir a atitude do sujeito, tem uma função de ressocializar e ele tem também uma função simbólica”, explica a advogada criminalista Jéssica Rodrigues. Essa função simbólica, explica ela, é de mostrar para a sociedade a postura diante de “condutas que não são aceitáveis”, inclusive quanto à punição daqueles responsáveis por elas.

Na última segunda-feira (9), a empresária Renata Coan veio a público falar sobre o estupro sofrido por ela, em janeiro deste ano. O momento doloroso também não era desejado: a exposição aconteceu apenas depois que ela soube que a Justiça havia decidido libertar o homem responsável pelo crime.

Apenas cinco dias após ser condenado a mais de 8 anos de prisão, Edílson Florêncio da Conceição teve a liberdade provisória decretada, para aguardar pelo resultado de recursos ao processo. A sentença diz ainda que a pena será cumprida em regime semiaberto — o que está sendo questionado pelo Ministério Público do Estado do Ceará.

“A Justiça não está do nosso lado. Isso dói além de tudo que eu passei”, disse a empresária. “Isso me dói muito porque tudo [comprovou o crime]: depoimento, o réu confesso, policiais, testemunhas oculares, exames de ferida, tudo, tudo. Mesmo assim, o que mais faltava? Eu estar morta? Isso que ia valer a lei? Isso que ia valer o julgamento?”

A repercussão do caso, e a indignação com a liberdade de um homem condenado por estupro de vulnerável após 4 meses de prisão, levou a críticas ao Poder Judiciário, a partir da juíza responsável pela decisão, mas também à legislação vigente sobre agressões sexuais contra mulheres.

O PontoPoder entrevistou três mulheres para entender os impactos da decisão judicial não apenas na vítima, mas em todas as mulheres e na sociedade, e quais os caminhos para evitar a repetição de casos de impunidade na violência contra a mulher.

Foram entrevistadas:

  • Professora da Universidade de Fortaleza e mestre em Direito Constitucional, Wagneriana Camurça;
  • Advogada criminalista e professora universitária, Jéssica Rodrigues; e
  • Professora de Psicologia na Universidade Estadual do Ceará (Uece), com atuação em pesquisa e extensão para prevenção e acolhimento de mulheres vítimas de violência, Layza Castelo Branco.

CONFIRA A ENTREVISTA COMPLETA:

TIVEMOS UM CASO RECENTE DE UM HOMEM CONDENADO POR ESTUPRO QUE FOI SOLTO PELA JUSTIÇA PARA AGUARDAR O JULGAMENTO DOS RECURSOS EM LIBERDADE E CUJA SENTENÇA DEVE SER CUMPRIDA EM REGIME SEMIABERTO. QUAIS OS IMPACTOS SOCIAIS DE UM EPISÓDIO COMO ESSE?

WAGNERIANA CAMURÇA 

Primeiramente, é necessário compreender o contexto legal em que se deu essa soltura. O réu estava preso há mais de 6 meses e a pena que recebeu, descontado o tempo que já estava no cárcere, ficou abaixo dos 8 anos, o que, pela legislação penal, implica o regime semiaberto. Também, quanto à possibilidade de recorrer em liberdade, essa é a regra prevista na legislação, em razão do princípio da presunção de inocência.

Tiradas essas considerações iniciais, casos como esses em que pessoas reconhecidamente culpadas por crimes dessa natureza, são preocupantes. Na criminologia estuda-se a vítima e, nesse contexto, falamos de três tipos de vitimização. A vitimização primária é o cometimento do crime diretamente à pessoa. Toda a dor que ela passa. Temos a vitimização secundária quando essa vítima procura os órgãos públicos e não é acolhida, é obrigada a repetir o que aconteceu, é obrigada a dar de cara com seu algoz, é obrigada a vê-lo sair pela porta da frente enquanto ela tem que se esconder.

Esse fenômeno da vitimização secundária gera a vitimização terciária, em que outras vítimas, vendo o que aquela pessoa passou diante do crime que sofreu, preferem se calar, se guardar, não apontar o criminoso, com medo da vergonha e do escárnio público. Ela vê que não vale a pena ir atrás do agressor porque ele sairá impune. A vitimização terciária faz surgir o fenômeno das chamadas cifras negras.

Muitos crimes que acontecem o Estado nem fica sabendo, porque as vítimas simplesmente não denunciam, com medo e vergonha e por entenderem que o Poder Público é ineficaz, incapaz de punir o agressor, até porque o apoia, mesmo que indiretamente. Para a sociedade, em que há muitas vítimas de violência sexual silenciadas pela falta de apoio institucional, por decisões que abraçam agressores e duvidam de suas palavras, até botando culpa nelas pela violência, fica a sensação de impunidade, de que vale a pena cometer crimes dessa natureza, porque as pessoas sairão impunes.

Essa sensação de impunidade gera também outro fenômeno: o da vingança. Como não se confia no Estado, as vítimas passam a querer punir elas mesmas seus algozes (vingança privada), desestabilizando a ordem social.

JÉSSICA RODRIGUES

O direito penal tem uma função de reprimir a atitude do sujeito, tem uma função de ressocializar e ele tem também uma função simbólica, que é de dar para a sociedade uma resposta sobre determinadas condutas que não são aceitáveis.

Quando acontece uma situação como essa, uma situação que que causou espanto até mesmo para nós que militamos na seara criminal… Eu sou advogada criminalista há 10 anos e eu vi isso acontecer pouquíssimas vezes. Na verdade, acho que é a primeira vez que eu vejo isso acontecer, de uma pessoa condenada em um crime de estupro de vulnerável, um crime que é gravíssimo, que a reprovação social é altíssima, ter uma sentença com um regime semiaberto e, estando preso, a juíza dar para o direito de recorrer em liberdade.

Geralmente, já que a pessoa ficou todo o processo presa, o comum é que ele permaneça preso até que transite em julgado todos os recursos. (…) Na prática, como acontece: se a pessoa foi presa em flagrante e ela aguardou todo o processo em liberdade, ela permaneceria em liberdade. Se aguardou todo o processo preso, permaneceria preso até que transite em julgado todos os recursos que cabem tanto à defesa quanto à acusação.

Quando acontece de ser solto, com tão pouco tempo preso, dá uma resposta para a sociedade de que aquele crime “compensa”, porque vai estar dizendo ‘olha, cometeu um crime bárbaro, mas já está em liberdade, está cumprindo pena no regime semiaberto’.

Outra coisa que me espanta é que, aqui no Ceará, o regime semiaberto só acontece de duas formas: ou pessoa que está cumprindo a pena fica no presídio, como se estivesse cumprindo pena em regime fechado, ou ela sai no regime semiaberto com a condição de ficar na prisão domiciliar, que é o chamado semiaberto harmonizado. (…)

E, geralmente, os juízes da execução penal só concedem esse semiaberto harmonizado quando é crime que não tem violência, que não tem grave ameaça, que não envolve violência sexual. Então, isso causa espanto também, porque se esse rapaz, que foi condenado em 1º grau, se tivesse permanecido preso e fosse mandado o processo dele para uma Vara de Execução Penal, muito dificilmente um juiz iria conceder um regime de cumprimento de pena no semiaberto harmonizado, que é em prisão domiciliar com uso de monitoramento eletrônico.

LAYZA CASTELO BRANCO

Quando uma decisão vem a se torna pública, que outras mulheres vão ter acesso, existe o sentimento, que a gente tem cada vez mais estudado, de sororidade. A sororidade vai falar desse sentimento de identificação da dor de uma mulher com a dor de outra mulher. Então, quando se torna público, ou mesmo que não se tornasse, porque uma mulher vai conhecendo e vai passando para outra mulher e sabendo, isso vulnerabiliza todas as mulheres.

Saber que um homem que cometeu tamanha agressão, tamanha atrocidade, num estupro seguido de tentativa de assassinato, saber todas as peculiaridades desse caso, que foi visto por três policiais, representantes também da lei e da Justiça, da ordem social, isso vulnerabiliza as mulheres. O que ouvi nos relatos das mulheres ao meu redor é que se isso, nessa dimensão, aconteceu e o agressor está solto, os homens vão ficar se sentindo livres para cometerem violências.

Por mais que nós tenhamos leis, como a lei Maria da Penha, que é considerada uma das melhores do mundo, em termos de proteção e prevenção à violência contra a mulher – e ela é uma lei bem completa, complexa, muito estudada e muito aprimorada –, a gente ainda está muito longe, aqui no Brasil, muito longe mesmo, de erradicar a violência contra a mulher.

Quando uma situação como essa se torna absurdamente… Por que o que é ele responder em liberdade? É a Justiça dizer que nenhuma outra mulher corre risco diante dele. Eu gostaria de saber qual mulher tem coragem de estar diante desse homem, por exemplo. Ele me apavora. Eu fico apavorada em saber que um homem como esse pode circular entre as mulheres, dentro de um ônibus, num shopping, numa praia. (…)

O impacto disso é, não tenha dúvida, todas as mulheres que eu tenho visto, elas estão inquietas, angustiadas. Isso tem gerado angústia. Eu vi pessoas angustiadas, inquietas, desesperançosas, tristes. Mulheres entristecidas e indignadas. Esses são os sentimentos que eu vi nesses dias, com essa notícia. Indignação, tristeza, medo, desesperança.

A decisão da justiça não mexe só com a Renata. Infelizmente mais com a Renata, a mulher vitimada. Mas ela mexe com todas as mulheres que, assim como a Renata, pegam um Uber, vão pra festas, porque a mulher deve e pode. Graças a evolução da sociedade, estamos vivendo num tempo histórico onde as mulheres têm a liberdade de sair, de passear, se divertir. Então, mulheres saem, passeiam, se divertem, pegam o Uber para passear, para trabalhar, para ir para o local de estudo. (…)

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Nós mulheres conquistamos a liberdade de circular, de andar, de sermos o que quisermos e estarmos onde quisermos e os homens, principalmente os agressores psicopatas, ou com transtorno de personalidade antissocial, insistem em nos deixar amedrontadas, em nos vulnerabilizar e tolher essa nossa liberdade tão suadamente conquistada.

Isso gera essa instabilidade psíquica nas mulheres. O comentário que eu tenho escutado é que as mulheres, que souberam da história, estão se sentindo instáveis psiquicamente, por conta de diversos sentimentos, como uma mobilização a partir de tristeza, medo, ansiedade, angústia, descrença na Justiça, desesperança. Isso mexe com todas as mulheres e com toda a sociedade. Então, tem uma hiperdimensão, muito além do que circunscrita apenas no caso.

A SENSAÇÃO DE IMPUNIDADE QUANTO AO CRIME FOI CITADA PELA VÍTIMA NESSE CASO E TAMBÉM POR ALGUNS CRÍTICOS DA DECISÃO JUDICIAL, INCLUSIVE O SECRETÁRIO DE SEGURANÇA DO ESTADO. EXISTE UMA REPETIÇÃO DE DECISÕES JUDICIAIS DE HOMENS ACUSADOS OU MESMO CONDENADOS POR VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER QUE TÊM ATENUANTES. COMO EVITAR A REPETIÇÃO DE CASOS DE IMPUNIDADE NA VIOLÊNCIA DE GÊNERO?

WAGNERIANA CAMURÇA 

Não tive acesso à sentença que decidiu o caso, até porque em razão da matéria, ela deve estar em segredo de justiça. Quando o magistrado vai julgar um crime, ele tem que seguir critérios determinados em lei, previstos no artigo 68 do CP (Código Penal). Lá, informa que ele deve estabelecer a pena base e depois aplicar atenuantes e agravantes e causas de diminuição e causas de aumento de pena. Ou seja, não há aleatoriedade na escolha da pena. O magistrado não pode, pela legislação, aplicar a pena apenas com base na gravidade do crime. Quanto mais circunstâncias negativas o acusado tiver, maior será a sua pena e vice-versa.

Crimes de estupro têm penas altas que giram entre 6 a 10 anos, só na base. Quando se parte para as atenuantes, previstas no artigo 65 do CP, o juiz tem que aplicar. Não se pode deixar de aplicar pela gravidade do crime. Os crimes sexuais não escolhem vítimas e nem existe um perfil de agressores, mas muitos são primários, até porque a gente tem percebido encorajamento das mulheres em denunciar seus agressores.

O que quero dizer é que embora a crítica seja válida, sem mudança na legislação, não há como negar a aplicação da norma penal com os critérios estabelecidos nela. Por isso há um movimento pela mudança dessas normas, para casos futuros, já que não podemos retroagir a norma penal para casos que já aconteceram.

Sim, há muitos agressores soltos, mas me pergunto se é exclusivamente falha da lei. Não teríamos ineficácia da atuação das instituições, de maneira geral, também? Há que se medir isso.

JÉSSICA RODRIGUES

É uma sensação (de impunidade) que assola todo mundo, toda a sociedade, sobretudo nós mulheres. É um sentimento que causa repugnância e medo a todas as mulheres.

Juridicamente falando, eu posso afirmar que a gente tem legislações que são muito boas, que protegem bastante a mulher. A grande questão passa pela aplicabilidade mesmo diante do caso concreto. E aí se pergunta: seria o caso de ter penas mais severas? Ou a gente já tem a pena e seria o caso de aplicação dessas leis de modo que venha realmente a punir?

Agora esse caso foi um bem peculiar, bem diferente, porque geralmente aqui no Ceará, o Tribunal de Justiça do Ceará é muito severo com crimes que envolvem violência sexual. Foi algo que me gerou um espanto muito grande, gerou um espanto muito grande para os profissionais do direito de uma forma geral. O risco dessa decisão é que abre um precedente para que outros juízes decidam da mesma forma. (…)

E eles decidindo da mesma forma, vai gerar ainda mais uma sensação de impunidade, justamente porque o direito penal serve para também dar uma resposta para a sociedade, também para dizer ‘olha, determinada conduta não é aceitável’.

LAYZA CASTELO BRANCO

O ideal seria que se fosse partir da raiz, que as pessoas que trabalham no Judiciário tivessem uma qualificação melhor para compreender (a violência contra a mulher), e isso não sou eu que estou dizendo. O Anuário de Violência, que saiu em 2024 baseado nos dados da violência no país em 2023, afirma que, por exemplo, aqui no Ceará, muitos crimes contra as mulheres, muitos assassinatos ainda não são notificados como feminicídio, são notificados como homicídio. (…)

Esse homem tentou matar a Renata, porque ele estava objetificando o corpo dela, porque ela é uma mulher, ou seja, (teve impacto da) condição de gênero, de ser mulher. O Anuário fala, por exemplo, que as subnotificações de feminicídio no Ceará, que é um dos estados onde o Anuário diz que tem mais problemáticas sobre notificar feminicídio, a equipe do Anuário afirma que uma das possíveis causas dessas subnotificações de feminicídios é a falta de compreensão das pessoas que trabalham na polícia e no Judiciário. O entendimento científico e social do que são as violências contra mulheres.

Então, uma maneira de sanar, de começar a sanar isso, é uma qualificação melhor, desde a graduação. Na lei Maria da Penha, que fala que todos os níveis educacionais deveriam colocar nos seus conteúdos, nos seus currículos, uma educação sobre o que é violência contra mulher, como enfrentar, como combater. Um trabalho educativo nesse sentido. Quase nenhuma escola, quase nenhuma instituição, nem pública e privada, nem de nível médio, nem fundamental, nem superior discute isso.

Estamos todos descumprindo a lei. Então, não me admira que representantes do Judiciário não consigam compreender a dimensão, porque a gente está falando de um caso específico, mas a dimensão da impunidade está enraizada em todas as instâncias e todas as instituições. Existe um desconhecimento do que é a violência, de como ela existe, do quanto ela existe, contra quem ela existe. Há uma ignorância na sociedade mesmo sobre isso. E a ignorância não é só das pessoas que não estudaram, existem pessoas que estudaram muito e que têm uma compreensão muito pequena e nada complexa, muito superficial, do que é a violência contra a mulher.

Então, a gente precisa de muita educação sobre isso, de muito letramento em todos os níveis educacionais, especialmente para os profissionais que vão trabalhar… Se uma pessoa decide trabalhar com criminalidade e julgar sobre criminalidade, ela tem que aprofundar os conhecimentos, inclusive sobre as causas e consequências de violências contra a mulher. Como fica a saúde mental das mulheres vitimadas, a saúde social das mulheres. Tinha que estudar de uma forma muito mais ampla.

Esse poderia ser um bom começo ou o melhor dos começos para acabar com a impunidade, que as pessoas sejam mais letradas no que é a violência contra a mulher, a dimensão aqui no nosso país, o quanto prejudica a saúde mental das mulheres e o quanto atrasa a sociedade.

DEPUTADOS FEDERAIS, COM BASE NESSE CASO, COMEÇARAM A APRESENTAR PROJETOS DE LEI PARA AUMENTAR A PENA OU IMPEDIR A SOLTURA EM CASOS DE CRIMES HEDIONDOS. UM AUMENTO NA PUNIÇÃO É SUFICIENTE?

WAGNERIANA CAMURÇA 

Embora seja importante que os nossos representantes busquem melhorar, através das leis, as questões sociais, isso parece o fenômeno que chamamos de legislação álibi, ou lei simbólica.

Explico: como uma forma de se dar resposta à sociedade, surgem os movimentos legislativos para pedir aumento de pena, o cumprimento integral da pena em regime fechado, até pena de morte e prisão perpétua. Dá-se a sensação ao povo de que estão consertando o problema, quando se sabe que a lei por si só não resolve.

Não se está aqui defendendo que não haja aumento de penas para determinados crimes, até porque a sociedade vai evoluindo e talvez as penas de 10 anos atrás já não condigam mais com a realidade contemporânea. A questão é que, primeiro, esses movimentos se sobressaem apenas quando aparecem casos na mídia (e como disse, crime sexuais enfrentam cifras negras, são subnotificados exatamente pela falta de eficácia da aplicação da norma); segundo, surgem como heróis do problema e com o discurso de que se a pena aumentar, os crimes diminuirão — e não há elemento científico para se provar isso, muito pelo contrário, nosso país tem muitas leis penais, mais de mil artigos de crimes, se contarmos além do Código Penal, a legislação extravagante e a violência no nosso país só aumenta.

Há propostas de leis, por exemplo, a questão de não poder progredir no caso de crimes hediondos que esbarram na Constituição Federal de 1988, que não veda a progressão (porque essa é considerada uma medida de ressocialização). Desde 1997, o STF mantém a posição de que qualquer norma que vede a progressão de regime é inconstitucional. Há projeto de emenda constitucional que visa tornar os crimes sexuais imprescritíveis, o que diminuiria a sensação de impunidade, pois hoje tais crimes prescrevem em média em 20 anos e muitas vítimas demoram a procurar o Estado para que se realize a persecução penal desses agressores. É a PEC do Estupro que está parada, mas que acredito que sofrerá questionamento, pois a CF/88 não veda a prescrição para crimes fora o racismo e ação de grupos civis ou militares armados contra o Estado Democrático de Direito.

Inclusive, é bom se alertar, que crimes sexuais não acontecem pelo “mero prazer” lascivo do ato, mas pela relação de poder, de julgo de um sobre o outro. Só aumentar a pena não diminuirá os estupros. Mudar o atendimento à vítima, evitar que ela seja humilhada tanto na fase policial como na fase processual, além de processos mais céleres, garantindo-se, é claro, o contraditório e a ampla defesa do acusado, são mais eficazes.

JÉSSICA RODRIGUES

Acredito que o aumento na punição vai gerar na sociedade uma sensação de que estamos sendo amparados pelo Congresso Nacional, pela legislação, mas não só. A gente precisa… Eu gosto sempre de bater nessa tecla, porque eu sou mulher, sou advogada criminalista, milito em favor dos direitos das mulheres e eu acredito que tem que ter penas mais severas, mas não só.

A gente precisa também passar por um processo de conscientização e de mudança estrutural na sociedade mesmo. Mas a questão das penas mais severas, claro que é algo que vai também trazer para a sociedade aquela sensação de que agora nós estamos sendo protegidos.

Eu vou contar um caso rápido. Tem um caso em que atuei, em que uma menina, a Tamires, foi assassinada, em 2009, pelo pai. E a mãe dela foi vítima de violência doméstica durante anos. E no júri foi perguntado porque ela (a mãe) não tinha feito nenhum boletim de ocorrência das violências que ela sofreu. E assim, na época dela, há 20 anos, nem existia violência doméstica contra a mulher no ordenamento jurídico.

A violência doméstica contra a mulher era tratada na Lei nº 9.099 de 1995, que é a lei de juizados especiais, que são crimes de menor potencial ofensivo. Então, não existia violência contra a mulher. Somente depois que veio a lei Maria da Penha, que começou a existir um trabalho de conscientização do que era a violência contra a mulher, foi que a mulher passou a ter mais proteção, tanto da legislação quanto do Estado.

LAYZA CASTELO BRANCO

É importante. Na minha opinião, ele (o lutador de MMA condenado por estupro) é um risco para a sociedade, sim. Ele não se tornou o que ele se tornou magicamente, no instante em que ele olhou para a Renata. Ele tem uma estrutura de personalidade que favorece ou que leva a esse tipo de comportamento. Pode ter sido descoberto nesse momento, mas nada garante que ele não tenha cometido outros crimes.

Eu penso que o rigor maior em saber se a pessoa, a depender do tipo de crime, como o dele, que foi considerada uma tentativa de assassinato, de feminicídio, na verdade. O feminicídio é um crime hediondo. Ele só não concluiu porque a polícia chegou. Ele estava nas vias de fato de concluir um crime hediondo. Então, tinha que haver um rigor maior.

Mas não é suficiente, óbvio. A gente precisa de uma grande educação na sociedade e de uma grande sensibilização social. Mas a gente também não tem como escolher por onde começar. Se os deputados estão começando por aí, ótimo. Poderiam também pensar nessa parte da educação, poderiam pensar no respeito ao que tem na lei Maria da Penha, que a gente faça acontecer o que está ali.

ESTAMOS VIVENCIANDO UM CONSTANTE AUMENTO DA VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER, COM O FEMINICÍDIO TENDO BATIDO RECORDE EM 2024. NESSE CENÁRIO, VOCÊ AVALIA QUE O JUDICIÁRIO COMPREENDE O PAPEL DELE NA DEFESA E PROTEÇÃO DAS MULHERES? E COMO FICA A CONFIANÇA DESSAS MULHERES NA JUSTIÇA?

WAGNERIANA CAMURÇA

O Judiciário tem trabalhado para combater a violência contra mulheres. Por exemplo, o CNJ institui regramento sobre julgamento sob a Perspectiva de Gênero (Resolução 492/2023), muito influenciado por fatos como a história da Maria da Penha e de Mariana Férrer. As outras instituições, como o Ministério Público, a Defensoria Pública e a OAB, têm também trabalhado no combate disso, seja por meio de ações concretas na defesa das mulheres, como nas ações educativas, em todos os âmbitos sociais. A Polícia também.

Há inúmeros regramentos que orientam a atuação dos sujeitos. Não se sabe se os números alarmantes que temos são porque aumentaram por causa da violência em si ou porque as mulheres, indo na contramão da vitimização terciária, estão tomando coragem e denunciado.

Vê-se muitas ações positivas por parte dos órgãos do Estado, mas notícias das vítimas vindo a público dizer que seus agressores estão soltos é de partir o coração. Ficamos sensíveis a pensar que não há esperança e que estamos a Deus dará. Mas acredito que se nos calarmos, ficará pior. Só o grito das vítimas para tornar alerta o Judiciário de que ele precisa cuidar para que as violências não se perpetuem.

JÉSSICA RODRIGUES

Eu acredito sim que o Poder Judiciário entende o papel dele com relação à proteção dessas mulheres. No estado do Ceará, esse caso foi pontual e, justamente por ser pontual, foi que causou estranheza, causa estranheza a todo mundo. Todo advogado criminalista se espanta com essa decisão, porque é um caso pontual. No geral, o Poder Judiciário do estado do Ceará protege muito as mulheres, ele tem consciência do papel dele. Tanto é que a gente tem a Casa da Mulher Brasileira, tem a delegacia de defesa da mulher. (…)

O grande problema dessa decisão, para além das questões pessoais com a vítima, é que pode gerar um precedente para que os outros juízes decidam da mesma forma. E isso pode acabar gerando na sociedade uma maior sensação de que não estamos protegidas. O grande problema dessa decisão, que foi pontual no Tribunal de Justiça do Ceará, é justamente porque abre precedente para que outros juízes decidam da mesma forma.

LAYZA CASTELO BRANCO

O Judiciário não pode ser responsável sozinho pela sociedade. Ele é parte da sociedade, uma parcela da sociedade, que representa a sociedade como um todo. Quem está representando o Judiciário faz parte de um amplo corpo social.

A mudança não tinha que ser só no Judiciário, tinha que ser uma mudança social mesmo. Na forma de pensar, na forma de construir os sujeitos, em como a gente vai educar as nossas crianças e os nossos adolescentes.

Até porque a gente tem muita gente bacana no Judiciário. Muitos profissionais, seja do Tribunal de Justiça, do Ministério Público, da Defensoria Pública, extremamente engajado nessa luta, nesse enfrentamento à violência contra a mulher. Mas qualquer setor da sociedade é composto por pessoas que se aprofundam mais na complexidade das problemáticas sociais e pessoas que são mais superficiais na forma de pensar a sociedade ou que não quiseram, que não tiveram oportunidade de aprofundar conhecimento.

Mas o Judiciário também tem muita gente que tem lutado ferrenhamente para a gente ter uma sociedade mais justa e menos violenta para as mulheres.

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